A preguiça do usuário
Este texto contém duas observações sobre a preguiça do usuário de produtos digitais.
I. Usuários não leem; eles escaneiam
Por conta das mudanças exigidas pelo GDPR (General Data Protection Regulation), várias ferramentas digitais foram obrigadas nos últimos meses a alterar suas políticas, e a garantir que os usuários fiquem sabendo das mudanças.
Uma dessas ferramentas foi o Google Analytics, que passou a exibir a seguinte mensagem em uma barra colada ao topo da tela.
“We've recently launched new Data Retention controls that may affect your data starting May 25, 2018. To dismiss this message, please visit your property’s Data Retention settings under Admin > Property > Tracking Info and click 'Save'. Learn more”
Ou seja, para eliminar a insistente mensagem, é preciso acessar uma das opções do menu do painel administrativo e clicar em um botão de Salvar.
Mas “usuários não leem; eles escaneiam”, já dizia Jakob Nielsen.
Pois é, não li mesmo. Depois de ter visto várias mensagens parecidas em outras ferramentas, meus olhos foram direto para o caminho que indicava a ação necessária. Ou seja, para o seguinte trecho:
“Admin > Property > Tracking Info and click 'Save'”.
Acontece que quando cheguei ao passo “Tracking Info”, não havia botão de “Save”.
Fui e voltei umas duas vezes até concluir que eu precisaria ler a mensagem inteira, e não apenas escaneá-la. E apenas então cheguei ao passo que faltava na ação, e que fora incluído pelo redator do Google antes do passo-a-passo:
“please visit your property’s Data Retention settings under Admin > Property > Tracking Info and click 'Save'.”
No fim das contas, acabei tendo mais trabalho do que se houvesse lido a frase inteira na primeira tentativa. E, embora consciente da minha própria preguiça, terminei a experiência com algum incômodo, o que não é bom para marca nenhuma.
2. Entre dois caminhos possíveis, o usuário escolhe o mais fácil
Um escritório que visitei há alguns meses me chamou a atenção por ser repleto de soluções interessantes para os funcionários. Entre elas, estava uma máquina de café que mói e prepara o café na hora, bastando apertar um botão.
Pelo que pude perceber, boa parte da equipe era bastante consciente dos impactos socioambientais causados por uma empresa (era um assunto frequentemente discutido pelos funcionários), e o uso do plástico não ficava fora dessa visão.
Talvez por isso eles tinham um armário cheio de xícaras e canecas de café, e uma pia onde podiam lavá-las após o uso.
Acontece que bem ao lado da máquina ficava uma pilha de copos de plástico, que além de estarem próximos não precisavam ser lavados.
Não tenho métricas para sustentar isso, mas a boa e velha observação me mostrou que quase todos os funcionários e visitantes preferiam estes copos às xícaras e canecas.
Por mais que a consciência do problema exista, ponha uma pilha de copos de plástico ao lado da máquina de café, e exercer essa consciência na prática fica bem mais difícil.